sábado, 7 de julho de 2012

Educação: na Korea e no Brasil



Parecia uma Torre de Babel. Tinha gente de todo mundo, todas as culturas, todas as línguas. A elite árabe representava a única cultura que não me despertou interesse. Tive amigos italianos, suíços, gregos, chineses, iuguslavos (não havia ocorrido a separação servo-croata), africanos, principalmente de Sierra Leoa e Gana, judeus e palestinos. Mas papo-cabeça mantive mais com os coreanos. Era bem o meio da década perdida, a era da inflação galopante do fim do governo militar e eu estava impressionado com o milagre econômico da Coreia.

Certo dia eu formulei a questão a um grupo de coreanos que aprendia alemão comigo no Goethe Institut em Mannheim em 1984: Como eles próprios compreendiam as razões do crescimento econômico da Coreia? Como um país pequeno, sem recursos naturais, dividido, em permanente estado de guerra podia apresentar toda aquela pujança econômica?

Eles mesmos não sabiam. Fiz diversas perguntas. Dentre muitas coisas, descobri como, ao contrário do Brasil, a indústria automobilística de lá havia estabelecido uma estratégia de desenvolvimento de marcas nacionais, e não de abertura às marcas americanas, como no Brasil. A Hyundai floresceu, a Gurgel faliu!

Chegamos, finalmente, à discussão sobre a educação.

Numa década em que a porcentagem de cidadãos com nível superior no Brasil batia algo em torno de 7%, descobri que na Coreia eram 33%. Mas como assim?

Foi então que descobri que a primeira escola pública na Coreia foi fundada há mais de 1600 anos, em 372 d.C. pelo Rei Sosurim de Koguryô, se chamava T'aehak (Grande Aprendizado ou Academia Nacional de Confúcio). Meus amigos coreanos foram unânimes em afirmar: a família, desde tempos imemoriais, dava extrema importância a que pelo menos um dos filhos tivesse formação universitária. E quando as finanças eram restritas, o pai elegia um dos filhos e o encaminhava ao curso superior. Então, toda a família se sacrificava para que o escolhido tivesse a oportunidade de se formar. Perguntei se eles não achavam que isto era uma injustiça com os outros irmãos que ficavam, muitas vezes literalmente no cabo da enxada, para que um deles se formasse. Me disseram que não. Por que aquele que havia tido mais oportunidades, tinha mais responsabilidades. Ao ter sucesso na vida profissional, deveria ser o responsável pela velhice dos pais e pelo apoio aos irmãos. Que este sentimento de responsabilidade era um peso que fazia dos estudantes coreanos serem extremamente responsáveis e comprometidos. A palavra usada por eles, em alemão, “fleiβig”. Trabalhavam duro, pois não poderiam falhar. Seria uma vergonha e a miséria para a família.

Voltei para o meu quarto no Studentenwohnheim pensativo. Que cultura é esta? Um sentimento do coletivo e da responsabilidade meio que desconhecidos em nossa cultura brasileira.

Lembrei-me destes fatos esta semana, por causa da greve que paraliza por mais de 50 dias 95% das Universidades Federais do País e deixa 1.600.000 alunos sem aula, bem como da discussão com Gustavo Ioschpe. Ele afirmou, no programa da Record, que a Coreia realizou o milagre da educação sem que o poder público investisse tanto na educação. A minha pergunta a ele neste blog foi: como comparar culturas tão distintas? E continuo, como quantificar as diferenças culturais no investimento em educação das famílias dos dois países? Fiquei pensando, qual é o custo social das festinhas dos estudantes? Na minha época eram apenas os embalos de sábado a noite. Hoje tem a sexta-feira negra, a quinta-feira sem lei, a segunda da revanche... Não são todos, nem sequer a maioria, mas quão distantes do sentimento grave de responsabilidade com os estudos da sociedade coreana!

Por que aqui, em especial para a imprensa, a escola e os professores são os únicos responsáveis pela falência da educação no País.

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