quinta-feira, 1 de novembro de 2018

A imprensa supérflua



Desde que se afastou do modelo de imprensa baseado em fatos, para a imprensa baseada em opiniões, a imprensa tem se tornado cada vez mais desnecessária.

Interessante por que a imprensa se defende de supostos "ataques" como ataques à liberdade de pensamento, se arvorando em "arautos da liberdade", sem se dar conta que a liberdade de pensamento se estabeleceu na história ocidental a partir da liberdade de cátedra. "Eppur si muove" diz Galileu ao sair da audiência do tribunal da inquisição. Ou seja, a liberdade de pensamento tem mais haver com a defesa da dignidade da Universidade do que da liberdade de imprensa.

Entretanto, a centralidade da opinião, as quais possuem forte conteúdo ideológico, em detrimento dos fatos faz com que a imprensa se aproxime mais da inquisição religiosa do que do livre pensar. E o movimento da sociedade parece ser o de que, se é para ter opiniões exdrúxulas, inteiramente desconectadas dos fatos como as que temos visto na imprensa brasileira, em especial nas redes de televisão, então melhor ficar com a fakenews de estimação de cada um. Por isto o tempo de televisão não teve nenhuma influência no resultado das eleições. A imprensa se tornou supérflua.

Vamos a um exemplo concreto.
Os comentaristas da GloboNews estão cada vez mais desinformados. Assistindo ao jornal das de ontem, 31 de outubro, me deparo com mais duas pérolas da desinformação que tem sido a tônica da imprensa brasileira.

Ao comentar a indicação de Marcos Pontes para o Ministério da C&T a Cristiane Lobo afirmou:  "O candidato cumpre sua promessa de indicar nomes da sociedade com afinidade com a área". Fiquei pensando, Ciência e Tecnologia e Ensino superior... que afinidades um militar de carreira, piloto de caças, astronauta, tem com estas áreas? Nenhuma! Não possui doutorado, não ensina, não orienta teses e dissertações, não publica, não tem Currículo Lattes, não desenvolve tecnologias ou produtos e inovação, é apenas um excelente piloto de caças por 25 anos e trabalha no Programa Espacial pela sua especialidade como piloto. Portanto, é um estranho no ninho da C&T. Minha irritação maior é devido ao fato de se perceber o nível de senso comum demonstrado pelos jornalistas. Transfere-se para o astronauta-ministro uma característica que é da NASA como agência de fomento da tecnologia ligada à atividade aeroespacial e à Astronomia. O pior, sua escolha para o ministério tem menos haver com o fato de ser um cientista, que ele não é, quanto o de ser um militar alinhado com a cosmovisão do presidente eleito. Este fato nem sequer é mencionado!

Mas, pouco depois, Gerson Camaroti arredonda o non sense com a desinformação. Afirma que acha positivo que se tenha uma indicação "da área" pois, segundo ele, em verificação com Cristiana Lobo, nos governos Dilma e Lula teria houvido apenas um caso de indicação de cientista pela presidente Dilma.

Fiquei boquiaberto diante da fala de Camaroti. As lembranças me levaram ao ano de 1987... Fui o autor principal de um artigo que meu orientador apresentou na International Conference on Magnetism em Paris neste ano. Centrado fortemente no desenvolvimento de minha tese de doutorado, não fui à conferência. Meu orientador, ao retornar, me conta que num jantar com alguns cientistas participantes do evento, surgiu a discussão sobre a ciência no Brasil, País emergente, recém saído de longos 21 anos da ditadura militar. Alguém pergunta quem seria o maior cientista brasileiro da área de Magnetismo. Meu orientador me contou que houve rapidamente um consenso: Sérgio Machado Resende, da Universidade Federal de Pernambuco.

Sérgio Machado Resende, Ministro da Ciência e Tecnologia de 2005 a 2010, um dos mais longevos da pasta. Cientista de renome internacional, mais de 250 artigos científicos publicados, incluindo Physical Review Letter e Nature as maiores revistas acadêmicas da área, foi inteiramente esquecido por @cristilobe e @gcamaroti.

E eu me pergunto, para que serve uma imprensa que é pródiga em emitir opiniões, desinforma e não me surpreende com fatos?

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Criador e criatura




É dito popular que mente vazia é oficina do diabo. Temos visto nos últimos tempos que mente vazia também cria diabos...

A sociedade brasileira se deparou nos últimos dias com uma situação inimaginável até há seis meses atrás. Um político medíocre, que só entrou na política por causa de sua insubordinação como militar ao ameaçar "explodir bombas" no Rio caso não houvesse reajuste dos soldos, ameaça explodir a democracia no País.

Em tudo que defende, Bolsonaro é o protótipo do fascista. Intolerante, boca rota, defende a tortura e os torturadores, nega o carácter anti-democrártico do golpe militar de 1964, mente sobre a situação calamitosa de hiperinflação em 1985 que os militares criaram no País após 21 anos de ditadura. Porte de armas, fuzilamento de adversários... As ideias são tão absurdas que cabe a reflexão: "O que produziu o Bolsonaro?'.

A resposta é simples, embora muitos talvez não estejam preparados para encarar a realidade: Foi Sérgio Moro e a Lava Jato.

Antes que você queira começar o seu exercício de negação, me permita uma observação fundamental: "Se nem a justiça se curva à necessidade de provas, por quê o cidadão anti-lula precisa de ser racional e fático?"

O mensalão não condenou Lula por que se manteve rígido ao princípio basilar do Estado de Direito que é a necessidade de provas para uma condenação. Sérgio Moro e seus asseclas inauguraram a era que dispensa provas e se contenta com indícios circunstanciais como suficientes para a condenação. Assim, está inaugurado no País a era do linchamento público como norma. Na esteira, o impeachment de Dilma é somente uma etapa do processo que pretendia acabar com o maior e único partido político brasileiro, o Partido dos Trabalhadores.

O Ministério Público e o aparato justicial fazem um desserviço à Democracia ao atropelarem prazos para impedir que o povo expresse sua vontade de que Lula seja presidente. O alardeamento de denúncias requentadas pelo MP de São Paulo contra Haddad, assim que foi declarado o substituto de Lula na chapa do PT, é parte de uma estratégia de linchamento público de fazer corar Maquiavel.

Leio as denúncias, assim como leio as sentenças de Moro. Elas têm em comum o hilário.

Wilson Coelho, Marcelo Mendroni e Ricardo Manuel Castro estão sendo investigados pela Corregedoria por denúncias de "atos em atropelo processual, apenas com o objetivo de ganhar os holofotes durante o período eleitoral". Mas a leitura da denúncia é ainda mais reveladora. Não há uma única linha que possa ser ligada a Haddad, a não ser a conclusão subjetiva dos procuradores "Temos certeza de que Haddad está envolvido". Assim, a Procuradoria rasga qualquer resquício do Estado de Direito e infringe uma derrota à Sociedade. Não estão alí para "achar".

A leitura da decisão de Moro é estapafúrdia. A ausência de declaração de bens no Imposto de Renda é apresentada como prova. Talvez aí esteja a justiça (sic) em Curitiba assistindo demais filmes de Al Capone. O processo contra o bandido de Chicago no século passado viu no Imposto de Renda provas de enriquecimento ilícito. No caso de Lula, é apenas caso para declaração corretiva. Mas para o juiz, que se confunde com a acusação, é prova. E este é o ponto. No momento em que o esforço necessário de combate à corrupção se fez de forma partidária, ele perdeu a sua legitimidade.

Para mim é simples. Sérgio Moro deixa em branco os fundamentos da pressunção de inocência. Não demonstra a existência de Ato de Ofício, portanto, não pode haver acusação de corrupção. Não demonstra a propriedade do apartamento. Ao contrário, rejeita a prova apresentada pelos advogados de defesa de que o apartamento em questão foi colocado como garantia de empréstimos. A setença nem ao menos demonstra a posse.

O fato de o TRF4 ter se manifestado de forma "atropelada" é ainda mais grave: denuncia o objetivo de aparelhamento do judiciário paraobtenção de objetivos políticos, demonstra linchamento e não julgamento. E isto, quando envolve as instâncias de recurso, é ainda mais grave. Demonstra que o judiciário brasileiro se corrompeu.

Neste ambiente em que nada precisa ser mais demonstrado, surge Bolsonaro. Todas as fake news que fazem parte da estratégia do militar têm um campo fértil numa sociedade que abandonou a verdade como valor. 

Nunca foi intensão de Sérgio Moro e seus asseclas do MPF em Curitiba promover a ultra-direita. Entretanto, o anti-Petismo promovido pela turma do Powerpoint chegou a uma sociedade sem memória histórica e que nunca condenou explicitamente os crimes e os criminosos do Regime Militar. Assim, o fenômeno que se viu foi a loucura coletiva que vê em tudo -não precisa de provas- as mãos do PT. A rede Globo é PT e o PSDB é PT. Ursal, Foro... O Papa e a ONU são comunistas, etc...

PSDB nunca foi um partido. Se consolidou como pólo anti-PT. Entretanto, neste contexto das eleições, o anti-Petismo, promovido por Moro, não tinha mais o PSDB como opção. Estas eleições podem acabar com o PSDB como partido, pois a opção anti-Petista se deslocou para a extrema-direita, representada atualmente pelo defensor das armas.

Neste ponto, criador e criatura se encontram! A boa notícia é que a sociedade brasileira acordou para o perigo do aprofundamento do retrocesso democrático. A eleição de Haddad é a esperança de interromper o processo, iniciado pela Lava-Jato, que nos leva para longe do Estado de Direito.

PS. 01/11/18: Deve ser nomeado ministro. O crime realmente compensa... O eleito começa a pagar a inestimável dívida para com o juiz. 

sábado, 11 de agosto de 2018

Einstein e Chaplin




citylights07
 
Einstein: What I most admire about your art, is your universality. You don’t say a word, yet the world understands you!
Chaplin: True. But your glory is even greater! The whole world admires you, even though they don’t understand a word of what you say.
 As coisas não aconteceram bem assim, mas a história tem um pouco de verdade...

Plesch, médico e amigo de Einstein conta assim o encontro de Einstein e Chaplin em Hollywood em 1931 para o lançamento do "Luzes da Cidade" de Chaplin:

Once when Einstein was in Hollywood on a visit Chaplin drove him through the town. As the people on the sidewalks recognized two of their greatest, if very different, contemporaries, they gave them a tremendous reception which greatly astonished Einstein. “They’re cheering us both,” said Chaplin: “you because nobody understands you, and me because everybody understands me.” There was a good-humoured pride in his remark, and at the same time a certain humility as at a recognition of the difference between ready popularity and lasting greatness.

O certo é que são dois gênios do século XX.


Compilado de Quote Investigator. Ver LINK AQUI





sábado, 4 de agosto de 2018

Yo lloro por tí, Argentina!


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Os números da destruição são todos impressionantes.
A inflação está acima de 30% ao ano e não há perspectiva de melhora.  As projeções são de uma inflação em 31,8% e um recessão de -0,3% do PBI em 2018.
O que se nota é que a inflação está sendo fomentada pela política neoliberal de aumento de tarifas. O governo do presidente Macri, ex garoto propaganda do MBL sobre as propostas da liberalização da economia na América Latina, acaba de anunciar um aumento das tarifas de energia em 24%.

Os números da economia são arrasadores.
Pelo segundo mês consecutivo a atividade econômica na indústria tem retrocesso. -8,1% é o índice de crescimento negativo da indústria. Uma das mais afetadas é a indústria automobilística que recuou quase de 12%. Exatos -11,8%. Neste cenário, basta checar os números: dos 10 automóveis mais vendidos atualmente na Argentina, 8 são produzidos no Brasil! Só perde para a derrocada da indústria do petróleo, que caiu 19,9%. Até mesmo a indústria de construção civil, até há pouco o motor da economia Argentina da era Macri, iniciou sua queda, com número próximo a zero.

Este é o resultado na Argentina da insistência no modelo econômico defendido por Henrique Meirelles e pelo PSDB de Alckmin para o Brasil.

Corremos o risco de ir pela mesma ladeira abaixo no Brasil. Parece que a grande lição que Lula deu ao Fernando Henrique Cardoso não foi aprendida. Como disse Manuela D'Ávila em sua participação no Roda Viva, o que estes defensores do Neoliberalismonão consequem perceber é que a opção por atacar o enorme déficit social do País é o único caminho para o crescimento econômico, que é necessário para equilibrar as contas. Quando o seu salário está curto, há duas formas de resolver. Cortando gastos ou aumentando salário.  O PSDB  de Alckmin, ao ser entrevistado pela Rede Globo esta semana parece que ainda quer repetir a velha fórmula que fez com que o Brasil ficasse estagnado no segundo mandato da era FHC. Algumas das idéias são simplesmente hilariantes.

Veja por exemplo a "solução" de instituir a cobrança da pós-graduação, dentro da ideia de cobrar os ensino de graduação, "dos mais ricos". A primeira pergunta que é preciso fazer é, o que é "mais rico". Sim, por quê o que se teme é que mais uma vez a classe média, que vive de seu salário honesto, seja novamente a maior prejudicada.  Respondida esta pergunta, não tenho dúvida que uma das duas coisas aconteceram.

Ou o nível de "mais ricos" é baixo e a classe média assalariada vai pagar a loucura do PSDB de Alckmin, ou se verificará o que já temos dados objetivos na Universidade Pública Brasileira: que com a introdução das quotas, a Universidade Pública hoje é agente de ascensão social e está gerando mobilidade social. Ou seja, que a Universidade Pública não é mais somente para os ricos. Em ambos os casos, vamos verificar que a medida é inteiramente inóquoa para os cofres públicos.

Yo lloro por tí, Argentina. Mas choro copiosamente pela desgraça brasileira!!! 
 

terça-feira, 29 de maio de 2018

Esso, Shell; Esso Shell; e o Brasil pro beleléu...





A greve dos caminhoneiros surpreendeu a todos, mas seria mesmo de se surpreender? Uma análise possível verá dois rastros que nos permitem enxergar as origens e os focos de contradições que nos levam ao caos.

Uma linha nos leva às razões concretas.
A descabida e desastrosa política de aumento diário do preço dos combustíveis, idealizada de forma brilhante (sic) por Pedro Parente na presidência da Petrobras e com a responsabilidade política de Michel Temer, foi o ingrediente fundamental para colocar a sopa em fervura. Esta política destrutiva, não é defensável em nenhuma linha razoável de raciocínio.
Primeiro por que a auto-suficiência do País em relação ao petróleo e ao gás natural avança a passos largos. Especialistas argumentam que o petróleo brasileiro é pesado (sic) e a importação de petróleo leve é necessária. Mas por certo, não nos níveis de comprometer em 100% os custos da Petrobras. Assim, com uma inflação abaixo de 3%, como justificar o aumento de mais de 50% nos últimos doze meses, se os insumos, os salários e o operacional não dependem da variação do dolar? Ao contrário, o aumento vertiginoso dos combustíveis determinado pelo tucano Pedro Parente tem impacto dramático para a atividade dos caminhoneiros e se configura na razão objetiva da deflagração da greve. Some-se a isto o fato do governo ter recebido alertas e reinvidicações de mudança desta política desde outubro de 2017 sem tomar conhecimento. A política de preços da Petrobras beneficia aos seus acionistas e à Shell, que passou a importar gasolina em detrimento da capacidade de produção das refinarias no País. E aí, o menestrel Juca Chaves já denunciava, "Esso, Shell, e o Brasil pro beleléu..."

Outra linha, nos leva às razões subsidiárias.
O País está profundamente dividido. Um presidente com 3% de aprovação é democraticamente insustentável! Mas a crise é mais profunda, o País abusou da possibilidade de minar suas instituições e o descrédito na democracia se instaurou. A cassação do mandato presidencial de uma presidente democraticamente eleita possui razões dúbias, no mínimo. A perseguição ao candidato à presidência que possui 40% de intenção de votos, em um processo frágil, questionável, e que expõe, não somente o algoz juiz Sérgio Moro, mas todo o judiciário, como protagonistas de um profundo golpe nas instituições democráticas. "Todo poder emana do povo e em seu nome será exercido" passou a ser um escárnio jurídico. Por duas oportunidades o Congresso Nacional teve em suas mãos a possibilidade de salvar a democracia e reestabelecer o equilíbrio entre as forças políticas que dirigem a nação nos últimos vinte anos. Houvesse Temer sido cassado e convocadas novas eleições, haveria a possibilidade de um debate nacional, que está emperrado na medida em que forças da direita do judiciário querem a todo custo impedir a candidatura de Lula. A militância do PT alertou que a prisão de Lula levaria o País ao caos. A direita, representada pela grande imprensa, comemorou o fato de que a prisão de Lula não levou a militância do PT a instaurar o caos no País. Mas a decepção com a democracia e com a falta de representatividade, numa sociedade que não se sente representada nem na imprensa, nem no judiciário e nem no Congresso, e que corroeu a representatividade dos sindicatos; e que agora se defronta com a anarquia de movimento sem lideranças democráticas.

"A prisão de Lula mergulha o País num caos político", alertou o Washington Post em 6 de abril. Agora nós já sabemos que não existe caos político sem caos econômico!

quarta-feira, 2 de maio de 2018

Tá lá um corpo estendido no chão...


"Tá lá um corpo estendido no chão..." e ele representa a fugaz democracia brasileira!

Moro criou um muro de ódio que não para de se estender em todas as direções. Um muro que perpassa as famílias, um muro que divide a sociedade.

Há quem negue, mas para mim, os fatos mostram que estamos em pleno regime de exceção, e o paralelo com a implantação da Ditadura Militar de 1964 é gritante. Com uma única ressalva, no atual momento político, a ditadura militar foi implantada antes de 31 de março...

Assim como com Jango, a presidente Dilma foi deposta no golpe de 2016 e seu cargo "declarado vago", como queriam os militares, para justificar a ruptura democrática de 1964. Assim como JK, virtual presidente que seria eleito nas eleições não realizadas de 1965, Lula foi cassado e mantido em cela solitária pelo Juiz Sérgio Moro, com o único propósito de impedir que ele ganhe as eleições deste ano.

Assim como em 1964, as panelas bateram na "Marcha pela Família", a Rede Globo faz uma série de longos editoriais defendendo os golpes que se repetem, se unindo à Folha e ao Estado de São Paulo na defesa da ditadura. Uma situação que está nos levando à derrocada das instituições democráticas.

Aqueles que defendem a democracia, picham o prédio da residência da presidente do STF, Ministra Cármen Lúcia, mas os que foram inflados pelo ódio criado pela Lava Jato assassinam Mariele. Ambas são agressões, mas não há como comparar a manifestação daqueles que se tornaram sem voz pela democracia de 1988 em seu ocaso, e aqueles que assassinam os que lhes são contrários. Inclusive com o incentivo e apologia ao crime do militar-candidato que consolidou os mesmos 10% de apoio que tiveram os militares golpistas de 1964.

As eleições que se aproximam não permitem visualizar qualquer possibidade de êxito na pacificação do País.

Na análise de Faulhaber, publicada no El País (Veja AQUI), as eleições de 2018 serão protagonizadas por três atores.

Bolsonaro consolidou seus 10% de seguidores, pode captar mais alguns votos, mas ainda assim não tem nenhuma possibilidade de construir um consenso nacional, até porque seu discurso de ódio não ajuda a criar a paz.

Longe de formar uma maioria, Joaquim Barbosa, se candidato, se vencer sua inexperiência, se ...  deverá ser um novo Collor de Mello. Pode até vencer as eleições, mas terá então um choque de realidade. Ou compra a maioria parlamentar, negando o discurso que o leva à vitória, ou afunda o País na crise que leva à conclusão do processo de ruptura democrática.

A Esquerda, contra a qual se insurge a República de Curitiba e a despeito dela, avança como maior força política do País. Entretanto, se unida e acertando o "timing e o candidato", deve consolidar no máximo 40% dos eleitores. Se ganhar as eleições deste ano, seria sem formar uma maioria parlamentar.

E assim qualquer que seja o candidato eleito, não há perspectiva de normalidade institucional. Aí o 31 de março pode ser antecipado para 1 de janeiro!

Tá lá o corpo estendido no chão, e não é de nenhuma pessoa física... 

PS.:  Aliás, ontem foram 44 corpos desaparecidos nos escombros de um prédio que evidencia a carência de políticas públicas e a necessidade do "Minha Casa Minha Vida"...

segunda-feira, 16 de abril de 2018

Justiça seletiva não é justiça


Com a decisão da ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de enviar para a esfera eleitoral uma investigação contra o ex-governador paulista, que tramitava até agora na esfera criminal, faz crescer  a sensação de uma justiça seletiva.

Os casos do PSDB são escandalosos e não há como justificar o desequilíbrio no tratamento dado entre os casos do PT e do PSDB. A gravação mostra que o senador Aécio Neves pediu dinheiro a um empresário que confessou comprar parlamentares. O senador propõe que o dinheiro seja movimentado por alguém “que a gente mata antes de fazer delação". O ex-governador Geraldo Alckmin recebeu em espécie, e não declarou, R$ 10 milhões da Odebrecht, mas responderá apenas na Justiça Eleitoral. É tanto dinheiro que é necessário uma verdadeira operação criminosa para acumular e transportar o dinheiro.

Os líderes e ex-candidatos à presidência da república pelo PSDB têm as mãos sujas e a diferença com que são tratados os casos do PT e do PSDB reforça sim o sentimento de "justiça seletiva", cujo outro nome é "judiciário corrupto".

Creio que a condenação e eventual prisão dos caciques do PSDB, bem como do PMDB, não restabelecerão o desequilíbrio instaurado pela açodamento da Lava Jato e do Juiz Sérgio Moro contra o Presidente Lula. Tenho neste ponto uma posição semelhante à apontada pelo sociólogo Celso Rocha de Barros em entrevista na GloboNews (veja AQUI) à jornalista Renata Lo Prete.

Para o sociólogo, o desequilíbrio já está estabelecido, pois esta onda pseudo-moralizante do País afetou muito mais a esquerda do que a direita, que tem se safado impune até agora.

Para ele, o "que teria garantido que a lei é para todos é se o Temer tivesse caído com a prisão do Joesley, um negócio que teve um preço político para a direita brasileira imenso, se o Eduardo Cunha tivesse caído no processo do impeachment, quando já tinham evidências amplas contra ele, isso teria um peso gigante contra a direita brasileira. E aí a gente poderia comparar com a esquerda, que perdeu um mandato presidencial com a Dilma e um candidato favorito este ano". Além disto, o "Aécio conseguiu que livrassem ele lá, o PT não conseguiu. O Temer com o Gilmar. Quando veio o julgamento do Lula, o chefe das Forças Armadas veio a público ameaçar com um golpe de estado e ele não havia feito nada disso quando se levaram duas denúncias contra o Temer no Congresso".

Assim, conclui o sociólogo, "só vou me convencer que a lei é para todos, que aliás é o nome do filme lá da Lava Jato, quando eu ver o outro campo, o pessoal da centro-direita, tendo custos políticos semelhantes ao que a esquerda pagou. Por exemplo: se prenderem o Temer ano que vem. Quem é Michel temer ano que vem? Ninguém nem vai lembrar do nome dele. Se pegarem o Aécio ano que vem. Que importância tem o Aécio Neves a esta altura do campeonato?"

A prisão dos caciques do PSDB restabelece o equilíbrio? Creio que não. A prisão ilegal** de Lula tem um custo político imenso para a esquerda. O candidato que, mesmo após a prisão, lidera a intenção de votos deverá ser impedido de disputar a eleição. É o segundo golpe de impeachment.

Neste fim de semana, o DataFolha divulgou sua pesquisa de intenção de votos para as eleições de outubro. É de certa forma hilário perceber o desespero da grande imprensa com o fato de que Lula é disparado o candidato preferido. O Globo destaca "Lula cai e Marina encosta em Bolsonaro". Os números, 31%, 10% e 15%, atribuídos a estes candidatos, respectivamente, não permitem esta análise. Como destaca Boechat no comentário de hoje, Lula não despencou. Se considerarmos a imensa propaganda e a tremenda exposição do que significa o maior político da atualidade no Brasil sendo preso, os 31% de intenção de voto é uma declaração popular de descrédito do judiciário e da Lava Jato. De fato, mais de 40% da população acredita que a prisão de Lula é injusta**. Assim, mesmo pessoas que não vão votar em Lula, acreditam que há injustiça contra ele.

O segundo golpe está em andamento e a população percebe isto. Como ouvi de uma trabalhadora negra, que educa seus filhos com dignidade, e ainda não conseguiu entrar no programa Minha Casa Minha Vida, que é o seu sonho: "Quando o Lula foi preso, meu marido perguntou, e agora, em  quem vamos votar. Eu respondi, simplesmente, em quem o Lula apoiar."

Manuela, Boulos ou Ciro, quem tiver o apoio de Lula, será o candidato. Simples assim. Mas a história vai cobrar a posição de todos os que não  percebem que a prisão de Lula é um atentado à democracia. 

_____________________________

 *  O Globo destaca o oposto, como se esta fosse uma questão de votar e a maioria decide. Não. 40% acreditando na injustiça do judiciário contra um cidadão é uma catástrofe, é o descrédito da Lava Jato e da onda moralizante que assola o País.

** Prisão ilegal por diversos motivos, mas principalmente pela fragilidade da setença de Sérgio Moro: 1) Não houve propriedade; 2) Não houve prova de usufruto e posse; 3) Não houve identificação de ato de ofício. Para uma longa discussão com 122 juristas, acesse o livro "Comentários a uma setença enunciada" AQUI.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Carta aos meus irmãos evangélicos sobre as Vacas de Basã...




Queridos irmãos,

em postagem na mídia social, um dia após a condenação de Lula em segunda instância, afirmei que as Vacas de Basã teriam se alegrado...
Sim, a linguagem nestes tempos radicais são mais contundentes.
Alguns se magoaram. Indevidamente. Não se trata de um xingar.

Vacas de Basã é para mim um conceito teológico, é um termo bíblico. Gostaria de lhes contar o que a Bíblia me ensinou sobre Vacas de Basã.

Houve um tempo de glória no Reino do Norte em Israel, há quase três mil anos.
As fronteiras do reino se expandiram, o controle das rotas de comércio entre o oriente e o Egito, bem como o controle dos portos fenícios, trouxeram o florescimento de uma economia de mercado. Era o milagre Econômico! Junto com a prosperidade de alguns, a exploração do trabalho, a mais-valia, trouxeram o recrudescimento da pobreza em Israel.

De um recanto do reino do Sul, Tecoa, vem um profeta laico, um humilde pastor, para denunciar a insensibilidade da sociedade da época.

Ai dos que dormem em camas de marfim, e se estendem sobre os seus leitos, e comem os cordeiros do rebanho, e os bezerros do meio do curral;
Amós 6:4
Ai dos que dormem em camas de marfim, e se estendem sobre os seus leitos, e comem os cordeiros do rebanho, e os bezerros do meio do curral;
Amós 6:4
Ai dos que dormem em camas de marfim, e se estendem sobre os seus leitos, e comem os cordeiros do rebanho, e os bezerros do meio do curral;
Amós 6:4
"Ai dos que dormem em camas de marfim, e se estendem sobre os seus leitos, e comem os cordeiros do rebanho, e os bezerros do meio do curral " Amós 6:4
Ai dos que dormem em camas de marfim, e se estendem sobre os seus leitos, e comem os cordeiros do rebanho, e os bezerros do meio do curral;
Amós 6:4

Sua palavra profética denunciava a imoralidade da falta de compaixão dos ricos que não se importavam com o sofrimento dos pobres.

"Que bebem vinho em taças, e se ungem com o mais excelente óleo: mas não se afligem com o sofrimento (ruína) de José"  Amós 6:6.

Não se afligir com a pobreza é colocado como um pecado grave das elites da época. Neste contexto, o profeta se lembra do Vale de Basã, fértil, onde as vacas que pastoreavam tinham comida farta e não precisavam se preocupar com o alimento de cada dia. Assim, ele se dirige às mulheres ricas das classes abastadas:

"Ouvi esta palavra vós, vacas de Basã, que estais no monte de Samaria, que oprimis aos pobres, que esmagais os necessitados" Amós 4:1

Aí se vê que a denúncia era não somente por que não se importavam com a dor causada pela pobreza, mas também por que participavam da opressão, da eternização da injustiça, pela exploração do trabalho do trabalhador.

Assim, Vacas de Basã são a elite que explora o trabalho do trabalhador e não tem sensibilidade para a luta contra a pobreza. O que sustentava esta sociedade hipócrita e desigual era um judiciário comprometido com as elites:

"Vós que converteis o juízo em alosna, e deitais por terra a justiça" Amós 5:7

e uma religião hipócrita, com louvores que não eram ouvidos por Deus, que exige, antes, o compromisso com a justiça social:

Afasta de mim o estrépito dos teus cânticos; porque não ouvirei as melodias das tuas violas.
Corra, porém, o juízo como as águas, e a justiça como o ribeiro impetuoso.
Amós 5:23,24
"Odeio, desprezo as vossas festas... afasta de mim o estrépito dos teus cânticos; porque não ouvirei as melodias das tuas violas. Corra, porém, o juízo como as águas, e a justiça como o ribeiro impetuoso." Amós 5:23,24 

Desde que esta palavra profética me alcançou ali pelos anos 80, tenho meditado em quão semelhante é o nosso País em relação às mazelas que o profeta Amós condena tão veementemente. Somos um País desigual, onde o luxo e a luxúria convivem com a miséria, lado a lado, como na foto acima. O último País a abolir a infâmia da escravidão, é ainda um País em que os negros não têm as mesmas oportunidades que os brancos. Vi, com alegria, o efeito da lei das cotas aumentar a presença de negros nas Universidades Públicas nos últimos anos.

Em 2014, os cientistas políticos Mark Weisbrot, Jake Johnston, e Stephan Lefebvre publicaram um paper (leia AQUI) detalhando os avanços sociais do País na era PT. Os dados são impressionantes. Os autores destacam a mudança na evolução da desigualdade no País. Mostram como os "maiores ganhadores" da política salarial da era PT foram os 40% menores salários, que tiveram um aumento real de participação na massa salarial de 11,3% para 21,1%. Na análise dos autores, o salário mínimo teve ganho real de 76,2% , gerando a maior contribuição para a redução da desigualdade no País. Destacam que o Bolsa Família contribuiu também, mas especialmente para redução da extrema pobreza e da fome. A mortalidade infantil despencou. São crianças que deixaram de passar fome. Em números, a redução da pobreza é estimada pelos autores em 65% nestes doze anos, retirando 31,5 milhões da pobreza, dos quais 11 milhões da extrema pobreza, números que estão de acordo com as análises de dados do Banco Mundial que temos publicado neste blog.

Quando vejo as pessoas, mas especialmente quando vejo irmãos evangélicos falando contra os programas sociais da era PT, do Bolsa Família e do programa de quotas nas Universidades, me vem a mente as Vacas de Basã. A falta de misericórdia daqueles que estão saciados e não se importam com a fome que sangra o País.

E aí você me pergunta, mas, Ulisses, e a corrupção? E eu lhe digo, rompi com o PT por causa dos indícios de corrupção, rompi por não aceitar a promiscuidade com os partidos corruptos que agora estão no poder. Diversos artigos que estão neste Blog demonstram como nunca fui omisso em denunciar os descaminhos do governo PT nesta área. Mas errei ao não perceber que o combate à corrupção está sendo usado como bandeira para ocultar uma política de exploração. Se a lei estivesse atingindo igualmente todos os partidos, este seria um valor para mim. Se a opção fosse entre o corrupto e o não-corrupto, este seria um valor para mim. Entretanto, o "juízo se converte em alosna" quando indícios são tomados como provas, quando denúncias contra os membros de um partido são postergadas e contra o PT são aceleradas. Mas em especial, o combate à corrupção, comprovada ou não, fica em segundo plano quando um golpe é perpetrado para por em andamento a maior e mais escandalosa destruição de direitos sociais e de políticas sociais já realizados no País, o maior retrocesso social da história de um País imensamente desigual. Caminhamos hoje para o aumento da pobreza. Este é o cenário real do atual desgoverno Temer, e a perspectiva de um governo do beligerante e hipócrita Bolsonaro é simplesmente catastrófica.

Neste momento me veem as palavras de outro profeta da mesma época, Miquéias:

"Ai daqueles que nas suas camas intentam a iniquidade, e maquinam o mal; à luz da alva o praticam, porque está o poder em sua mão! E cobiçam campos, e roubam-nos, cobiçam casas, e arrebatam-nas; assim fazem violência a um homem e à sua casa, a uma pessoa e à sua herança." Miquéias 2:1,2

O combate à pobreza e à injustiça social é um valor em si, e a indiferença ao sofrimento do outro é um escárnio a Deus. Esta é a razão pela qual "não ouvirei as melodias" de teus hinos e louvores, diz o Senhor através do profeta. Fico pensando que se você diz que a Bíblia é a sua única regra de fé e prática, e você ainda é indiferente à questão da justiça social, você deveria rasgar as páginas de sua Bíblia, retirando os livros de Amós, Miquéias, Tiago e muitas outras partes de sua Bíblia.

Nem todos os que se alegraram com a condenação de Lula são Vacas de Basã, mas certamente, todas as Vacas de Basã se alegraram. Dirão que é porque são contra a corrupção, mas desconfio de que não se importam com a luta contra a injustiça. Eu não serei o inocente útil que fica ao lado da indiferença ao sofrimento da fome e da injustiça. Espero que você também não!

Saudações em Cristo,

Ulisses
Ai daqueles que nas suas camas intentam a iniqüidade, e maquinam o mal; à luz da alva o praticam, porque está no poder da sua mão!
E cobiçam campos, e roubam-nos, cobiçam casas, e arrebatam-nas; assim fazem violência a um homem e à sua casa, a uma pessoa e à sua herança.
Miquéias 2:1,