sábado, 9 de março de 2019

Previdência, o que é?

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Previdência é uma política de Estado que tem certas características de um seguro de natureza social. Ninguém "prevê" um acidente que nos deixe incapacitados para o trabalho, ninguém prevê a hora de sua morte. Portanto, ela é um pacto de bem estar para todos. Paga quem pode, usa quem necessita.

Que ela precisa de reforma, me parece inquestionável. O discurso da esquerda de que a Previdência brasileira é superavitária me parece um contrassenso. Por diversos motivos, mas principalmente pela drástica transformação da estrutura demográfica do País.

Conversei com muitos cidadãos chilenos em uma viagem ao Chile recentemente e fiquei com a  impressão que o que houve no Chile, e que está em curso no Brasil, é a destruição da previdência como uma política de seguridade social. No Chile a aposentadoria é por capitalização. Ao aposentar, o trabalhador chileno tem de especificar em "quantos anos" pretende receber a "aposentadoria". Quanto mais curto o período de usufruto, maior é o valor mensal a receber. Esta é a lógica do princípio da capitalização individual. É como se o trabalhador tivesse que prevêr a data de sua morte. O que fazer depois se a morte não chegou e a capitalização se esgotou? É uma lógica perversa de antes do Estado de Bem-Estar Social.

A reforma é necessária para aperfeiçoar o sistema. Por exemplo, as mordomias dos militares e suas filhas, que, segundo dados recentes da Previdência, são o grupo que menos paga, mais tem privilégios e, percentualmente, estabelecem o maior déficit. 

Mas a destruição do conceito de previdência é um enorme retrocesso, o retorno à barbárie da velhice desamparada.

Uma coisa curiosa que acho uma desonestidade dos defensores da reforma liberal da previdência é a alegação que a aposentadoria do servidor público  com valor próximo ao integral é um privilégio. A desonestidade inicia-se por ocultarem o fato de que desde as reformas da previdência do governo Lula e Dilma, - ah sim, você não sabia? O PT fez três reformas da previdência e implementou ajustes drásticos na previdência do setor público, cujos efeitos, pela própria natureza da questão, só serão sentidos em 30 anos - não é mais o valor integral... Acho uma puta desonestidade não analisar o que foi realizado pelo PT, como se o problema não tivesse sido encarado de forma responsável pelo governo petista.

A desonestidade continua por não se enfatizar que se o valor da aposentadoria na previdência do setor público é próxima do salário integral, o recolhimento é sobre o valor integral. 

A desonestidade é ainda maior quando se percebe que nenhum estudioso da questão, defensor ou jornalista destaca o fato de que o Estado não recolhe ao fundo da previdência a contribuição patronal para a previdência do setor público. Assim, constrói-se um déficit ao longo dos anos.

E continua ainda pelo fato de não se investigar os números em separado. Qual setor público tem qual privilégio? Por que é visível que diversos "privilégios" destacados quando se quer defender a reforma não são dos "setor público" como um todo, mas são restritos ao judiciário e aos militares.

A desonestidade se verifica ainda ao não se defender, para efeito de justiça, a aplicação das mesmas regras da previdência pública para o setor privado. Creio que um sistema adequado seria que o setor privado pagasse a previdência pelo valor integral de seu salário. Claro que isto significaria que os salários pagos pelo setor privado deveriam ser auditados, pois hoje somente o setor público tem seus salários divulgados pelo portal da transparência...  E deveriam ser tomadas providências para evitar as fraudes, como por exemplo, no setor educacional, usar uma fundação sem fins lucrativos para pagar salários de trabalhadores de uma instituição privada com fins lucrativos.

Mas o mais grave, na minha opinião, é esconder os interesses do setor financeiro em ter a imensa massa de valores capitalizados pelo trabalhador brasileiro para financiar o lucro dos bancos. No Chile, eles ficam com praticamente 100% do lucro dos investimentos na ciranda financeira. Quando há perdas por fluações da bolsa, os trabalhadores é que pagam, perdendo suas economias. Diversos chilenos com quem conversei, de direita e de esquerda, argumentam que o trabalhador não decide a aplicação. São as operadoras dos fundos. Portanto, elas deveriam bancar os prejuízos, e não o trabalhador. 

A previdência social há muito não é sustentada por um "pacto de gerações". Mas a sua existência é um avanço civilizatório de respeito à velhice que deve ser aperfeiçoado, não destruído.