quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Cortar gastos ou asfixiar o Estado?

Paulão do PT de Alagoas, e outros deputados manifestam contra a PEC da Morte
O Blog de Míriam Leitão apresenta hoje, em texto assinado por Marcelo Loureiro, uma discussão sobre a percepção da população sobre a PEC dos Gastos Públicos. Leia aqui. No texto, Loureiro comenta a pesquisa Pulso Brasil, do instituto Ipsos Public Affairs, divulgada por Danilo Cersosimo¹ e Carolina Botelho². O articulista conclui que "apesar da rejeição à PEC do teto de gastos, 64% dos participantes defendem que o governo reduza suas despesas".

Com o título sugestivo, O paradoxo das ruas: contra a PEC, mas a favor de reduzir gastos, Danilo Cersosimo¹ e Carolina Botelho², apresentam uma análise dos resultados da pesquisa e, infelizmente, cometem uma série de erros. O principal deles está estampado no título: a pesquisa não permite a identificação de nenhum paradoxo!


Minha crítica à análise consta dos seguintes pontos:
1) A pesquisa é "velha", início de novembro. O debate se intensificou a partir da primeira apreciação na Câmara e a partir do início das greves nas Universidades. Qual é a percepção da sociedade hoje, depois das agressões aos manifestantes, depois de dois meses de greve nas Universidades?

2) Ao contrário da conclusão dos autores, não há nenhuma contradição ou paradoxo em ser contra a PEC e ser a favor de corte de gastos públicos. Existem inúmeras formas de cortar gastos, inclusive a que já consta da Constituição e da Lei de Responsabilidade Fiscal, que impede o gasto acima da arrecadação. A questão é que essa PEC não corta gastos, ela é uma opção draconiana de asfixiar o Estado Brasileiro por vinte anos. É uma opção anti-democrática, ao aproveitar um momento conjuntural de maioria de 3/5 do Congresso para inserir disposições transitórias em uma Constituição de 28 anos! Ou seja, se a PEC fosse um ideário de sociedade, deveria ser cláusula permanente da Constituição. Não o sendo, não deveria estar na Constituição. Portanto, é natural que, reconhecendo que o controle dos gastos públicos seja importante e necessário, não se tenha necessariamente a convicção de que essa proposta seja a mais adequada. Isto só seria verdade se esta proposta fosse a única possível, e não é!

3) Os pesquisadores defendem que: “poderíamos entender que as pessoas têm se mobilizado contrariamente à matéria a ser votada ainda que desconheçam a natureza e o conteúdo da mesma.” Esta conclusão é completamente errônea, infundada, e representa um grave erro técnico de análise, pois a amostragem da pesquisa não se limitou aos que estavam manifestando contra a PEC. Assim, é perfeitamente possível que quem se manifesta esteja consciente de sua posição, embora esta não tenha sido a amostragem da pesquisa.

4) Na verdade, a maior mobilização ocorreu nas Universidades. A pesquisa corrobora este fato ao apontar que jovens adultos em plena força de trabalho (25 – 59 anos) e os mais escolarizados é que conhecem a PEC e se posicionam contra ela, numa proporção inversa à do Congresso, 68% dos que se posicionam são contra a PEC! Na sociedade já há uma maioria de 3/5 contra a PEC, indicando assim o enorme divórcio entre o Parlamento e a Sociedade!

5) O dado realmente horripilante de toda a pesquisa é a constatação de que mais da metade da população desconhecia a PEC no início de novembro. Este fato se deve, possivelmente, à celeridade anti-democrática de sua tramitação, uma estratégia do governo visando aprovar goela abaixo uma mudança da Constituição sem o devido debate. Assim, esse fato indica que o Congresso, em clara usurpação do poder, altera a Constituição sem o necessário consenso na sociedade.
Há uma enorme diferença entre cortar gastos e asfixiar o Estado!
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¹Diretor da Ipsos Public Affairs
²Doutora em Ciência Política pelo Iesp/Uerj.


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