Prezado Sardenberg
em que pese a grande
admiração que tenho por você, causou-me estranheza o tom agressivo,
irreverente e desrespeitoso de sua opinião (link aqui) sobre a greve dos
professores das Universidades Federais. Seja pela imagem do dinheiro exposto, seja pelo tom, seja pelo "Uma desgraça" ao final.
Tendo realizado meu
doutorado na Alemanha, em alemão, posso dizer que conheço, muito
mais do que o seu jovem estudante de jornalismo, a realidade da
Universidade, lá na Europa e aqui no Brasil. Sua menção à
realidade européia é bem superficial, mas interessante. Recebi
oferta de emprego para trabalhar em uma Universidade alemã, mas, em
plena época da hiperinflação, preferi voltar para o Brasil para
dar a minha contribuição para o País. E a realidade que eu deixei
para trás é a realidade de uma Universidade que dá plenas
condições a que um professor pesquisador possa realizar, com
qualidade, as suas atividades de ensino e pesquisa. Uma situação
bem distante da realidade que temos por aqui.
Assusta-me, em seu
comentário, o nível de desinformação que não pode ser aceito em
um jornalista com a sua competência e trajetória de trabalho.
Ao contrário do que
você afirma, não é verdade que ocorram greves nas Universidade
todos os anos. Você está se confundindo com a realidade da Universidade há vinte anos atrás? Nos últimos dez anos só tivemos a greve que ocorreu em 2012, a maior greve jamais
realizada nas Universidades Federais, em que quase a totalidade das
Universidades parou por mais de quatro meses. Na sua visão, tanto
quanto na minha, é um absurdo esse tempo de paralisação.
Entretanto, a aplicação mínima dos procedimentos do jornalismo
poderiam lhe mostrar as razões desse absurdo. À época, o ministro
Aloízio Mercadante se recusou sistematicamente a receber os
representantes das Universidades. De forma aleivosa, como tem sido a
sistemática do Partido dos Trabalhadores no poder, articulou um
sindicato pelego que representava apenas quatro Universidades, para
assinar uma proposta salarial que sequer repunha as perdas salariais
ocorridas nos cinco anos de sua aplicação. Essa forma draconiana de
conversar com a Universidade, do então ministro Mercadante, está na
raiz do atual movimento.
No seu texto, você
erra novamente ao afirmar que “os esquemas de reposição de aulas
são mais do que precários, do tipo três meses em um”. Isso é
uma mentira, Sardenberg. Sou membro do Conselho Universitário de
minha Universidade e posso afirmar que não se trata com essa
leviandade o currículo e a Educação em nossas Universidades
Federais. Se o prezado jornalista se der ao trabalho de verificar, a
reposição da longa greve de 2012 só foi concluída, em minha
Universidade, neste ano. Todo o calendário foi cumprido em sua
totalidade. Ficamos sem férias regulares em janeiro e fevereiro
desde o ano de 2012. Desconheço qualquer Universidade em que o
calendário não tenha sido reposto integralmente. É preciso se
inteirar dos fatos antes de comentá-los.
A defasagem salarial
dos últimos seis anos aponta para uma perda salarial em torno de
20%. Não é possível ser tão inocente e insensível a ponto de não
prever uma reação a essa situação de arrocho salarial (este é o
nome correto da política que o Partido dos Trabalhadores tem
impingido à Universidade).
Prezado Sardenberg,
o atual ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, tem seguido a
mesma política de intolerância de seu antecessor e cabe ao
jornalista investigar e verificar qual afirmação é verdadeira. A
abertura ao diálogo seria a primeira providência, a fim de se
evitar o prejuízo aos cofres públicos que tanto lhe atormenta e
atormenta também a todos nós. Entretanto, quem causa esse
desperdício é o governo, ao não sinalizar com uma política
salarial que minimamente atenda à realidade de uma inflação de
dois dígitos. Em especial, tendo em vista que o Ministro teima em
propor um aumento escalonado com validade para quatro anos. Caro
Sardenberg, como prever o que será a evolução da economia nos
próximos quatro anos? Como aceitar um acordo de longo prazo no atual
cenário de incerteza?
Finalmente, prezado
Sardenberg, eu o desafio a provar que a universidade pública
brasileira é mais onerosa ao estado do que a universidade europeia.
Mas manuseie os dados de forma honesta. Um professor em cargo C4
(C-Vier), em uma universidade pública alemã, possui um salário
honesto, uma secretária, pelo menos um técnico de laboratório,
quatro a cinco colaboradores doutores, contratados sob sua designação
e responsabilidade. Em geral, estes colaboradores desempenham
atividades docentes, o que, se não for corretamente contabilizado,
pode gerar uma falsa distorsão na comparação da relação número
de docente por discente entre a universidade alemã e a brasileira.
Possuem ainda uma infraestrutura de espaço físico aproximado de 360
m² de laboratórios por docente, biblioteca, infra-estrutura de
comunicação e computação, uma política coerente de financiamento
de equipamentos e infra-estrutura de pesquisa, bem como de
financiamento de participação em congressos.
Caro Sardenberg, em
duas coisas estamos plenamente de acordo.
Primeiramente,
concordo com você de que está em curso a destruição das
Universidades Federais, como se deu a destruição da escola pública
da educação básica nos anos oitenta. O aumento das vagas no
período do governo Lula se deu, parcialmente, em função do aumento
do número de horas/aula e da precarização do trabalho docente na
universidade pública brasileira. A Universidade Aberta do Brasil –
UAB, instrumento indispensável à inclusão social pela oferta de
curso superior em pequenas cidades, foi inviabilizada pelos cortes
sem critério do atual governo.
Em segundo lugar,
concordo que a melhoria na Educação no País não é prioridade
deste governo, mas, infelizmente, ao que parece, também não o é
para uma grande parte da imprensa nacional.
Por favor, não faça
parte dos que estão destruindo esta universidade.
____________________
PS: Infelizmente o site do jornalista Carlos Sardenberg não permite o diálogo e o debate. Compreensível. Entretanto, a publicação de críticas honestas e a réplica por parte do jornalista seria um bom começo para promover o debate.
Assim, publico aqui a resposta do Carlos Sardenberg à minha Carta Aberta.
"Temos informações bem diferentes
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PS: Infelizmente o site do jornalista Carlos Sardenberg não permite o diálogo e o debate. Compreensível. Entretanto, a publicação de críticas honestas e a réplica por parte do jornalista seria um bom começo para promover o debate.
Assim, publico aqui a resposta do Carlos Sardenberg à minha Carta Aberta.
"Temos informações bem diferentes
O
senhor não imagina a quantidade de e-mails de colegas seus , ilustres
colegas, incluindo ex-reitores, que disseram que a minha coluna é a
expressão exata do que ocorre.
Talvez sua universidade seja uma rara e honrosa exceção .
O senhor é professor em qual carreira?
É titular?
Abraços
Sardenberg "
Minha crítica a esta carta-resposta é:
1) Não respondeu uma palavra sobre a acusação de estar mentindo sobre a frequência das greves. Talvez o Sardenberg confunda greve de professores das redes estaduais de Minas, da Bahia, do Parané com greve das federais. Ou talvez ele tenha construído seu preconceito na década de 90 e não esteja atualizado. Uma falta grave para um jornalista que deve se inteirar dos fatos diariamente.
2) Alega que a minha Universidade "talvez" seja exceção, mas não menciona os casos específicos, nem mostra os números que o levaram à afirmar que a reposição de aulas não é realizada de forma responsável pelas Universidades. Assim, continuo afirmando que sua afirmação sobre o tema é leviana.
3) Eu o desafiei a provar que a universidade pública brasileira é cara em comparação com universidades européias. Continuo aguardando os dados do jornalista. Enqanto eles não chegam, reafirmo que é mais uma afirmação leviana e sem base factual, expressando apenas o preconceito do jornalista a respeito da questão que ele se dispôs a discutir!
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